É
uma voz sorridente, a de meu pai. Num lapso de tempo entre o sono e a ação, uma
voz que me faz muito feliz é a dele, porque me sorri. Ainda que eu esteja no
limbo de mim, ou na raiva do dia, eu faço trégua com o mundo ao ouvir a voz de
meu pai. Alegria sem tamanho me toma, desde que eu era muito pequeno.
Olhe,
o meu pai é engraçado. E ele não é bonzinho, não. Mas o meu pai sorri com a voz
e ri com as orelhas.
Ele
é também é forte, mas tem medo. É tão fraco, meu pai. Às vezes, nem sabe para
onde vai, de tanto canto que já foi. Mas há um lugar que meu pai sempre vai e
que eu aprendi também com ele.
Meu
pai usou sua voz para me levar à Voz. Se ele tivesse feito apenas isso por mim,
e errado em tudo, estava bom.
(Já
está muito bom, pai. Toda aquela trilha que ficou para trás foi você quem
começou a abrir. Eu ando arrancando a grama pela raiz e isso machuca meus
dedos, que não são tão fortes como os seus. Sou grato pela parte que você já
fez, e preciso que você continue a fazer por trás de onde estou.)
Com
meu pai aprendi a dormir tarde. Não aprendi a levantar cedo. Aprendi a cantar e
a falar e a ler e a escutar sua voz. Eita, que voz danada de boa! É a voz de
meu pai quando fala sobre a Voz.
Todo
mundo diz que eu pareço com meu pai. Ah, se for verdade! Já é o bastante ter
uma voz quase como a de meu pai e defeitos quase idênticos. E só porque eu
sempre quis ser igual a ele.